Solução no momento passa por reafirmar retórica mais dura
Segundo a definição do próprio Banco Central do Brasil, a inflação é o aumento dos preços de bens e serviços e implica a diminuição do poder de compra da moeda. A população brasileira conviveu por um longo período com inflação descontrolada, que exigiu uma verdadeira batalha em 1994 para moderar seu comportamento e, desde então, a sociedade já emitiu diversos sinais de que não aceita o retorno deste fenômeno.
O controle inflacionário se tornou uma conquista da população brasileira e experimentou um de seus melhores momentos quando, mesmo na presença de diversas forças contrárias, houve reafirmação de uma meta de inflação ousada no patamar de 3%. Esse passo permitiu que as expectativas de inflação recuassem, abriu espaço para queda da taxa Selic e para um período de sensação de inflação sob controle. Porém, não foi suficiente para que a batalha fosse vencida.
O problema apareceu na outra parte da política econômica, no controle das contas públicas. A PEC da transição foi um primeiro sinal de que o controle das despesas não seria uma preocupação do governo e ficou mais claro com a substituição do teto de gastos por um arcabouço fiscal que passou a permitir crescimento real da despesa pública para os anos à frente.
Em um primeiro momento, o mercado deu a benção para a nova forma de controle das despesas por supor que o problema de dispêndio público ficasse controlado ao menos até a próxima mudança de governo, e a partir de lá passaria a exigir novas reformas que permitiriam vislumbrar um controle da relação dívida/PIB, ou seja, o arcabouço seria uma ponte para que novas reformas acontecessem a partir de 2026. Por outro lado, a benção do mercado sobre o arcabouço permitiu com que o governo fosse mais leniente com a expansão de diversas rubricas como BPC, abono salarial, seguro-desemprego, emendas parlamentares, Fundeb e Previdência, além de algumas aventuras no parafiscal que passam por fora do orçamento público.
Com isso, a ponte até 2026 foi dinamitada e passou-se a exigir medidas já em um primeiro momento para que se fosse possível vislumbrar uma trajetória de dívida cadente nos anos vindouros, sem ter muita capacidade de aguardar até 2026. O governo entendeu a necessidade de apresentar ao mercado um cardápio de ações que permitiriam esperar a sobrevivência do arcabouço nos próximos dois anos e, com isso, resgatar a credibilidade do instrumento. Podemos dizer que os mínimos esforços resultariam em uma situação macroeconômica melhor controlada.
Essa não foi a opção adotada. Na realidade, a opção foi a de combinar o anúncio de medidas fracas com a isenção de IR até R$ 5 mil, resultando em uma política fiscal continuadamente expansionista e a total perda de qualquer credibilidade que ainda existia na gestão das despesas públicas.
O primeiro impacto foi sobre o câmbio, com forte depreciação. Em conjunto com isso, observou-se uma mudança de percepção de inflação, que engloba não somente o mercado de ativos, mas toda a população brasileira. A crença de que a meta de 3% de inflação não somente é inalcançável, mas além disso indesejada pelo atual governo tomou conta da sociedade e um processo de aumento generalizado dos preços ocorreu. Como na definição inicial, implicou uma perda de poder de compra da moeda.
Com isso, já começamos a observar no início do ano um processo de aumento de preços mais generalizado na economia, em que os agentes econômicos, em sua decisão de definir preços de bens e serviços ou pedir reajuste salarial, levam em consideração um patamar muito acima da meta definida pela sociedade, levando a um processo de aumento cada vez maior de preços.
A pergunta relevante para hoje é: o que pode fazer o Copom para evitar o espalhamento dessa perspectiva inflacionária? Quando da última reunião, os diretores optaram, de forma correta, por telegrafar a necessidade de alta de ao menos mais duas reuniões em 100 pontos-base (1 ponto percentual) para a Selic. Desde então, observamos uma elevação mais significativa da perspectiva de inflação, a despeito de uma retórica forte da autoridade monetária.
A solução no momento passa por reafirmar a retórica mais dura contra a inflação, deixando ainda mais claro que o Copom fará o que for necessário para combater o processo inflacionário. Como as projeções condicionais vão indicar que a Selic necessária para levar o IPCA para a meta no horizonte relevante será de 17%, o comunicado tem que renovar o compromisso de elevação da taxa em 100 pontos-base por ao menos mais duas reuniões, deixando claro que o monetário atuará para controlar o processo inflacionário.