Como iniciar um processo de retomada de credibilidade que vem sendo perdida desde a última reunião do Copom?

O comitê de política monetária (Copom) se reúne diante de um processo decisório interessante, no qual temos uma combinação de taxa de juros real ainda em patamar elevado e comportamento benigno da inflação corrente, mas com a necessidade de ser duro em relação aos passos futuros.

O pouco tempo de existência da autonomia do Banco Central do Brasil, aprovada em 2021, ainda deixa dúvidas sobre conduções futuras de política monetária, principalmente nos momentos de mudanças de diretoria. O receio de que uma nova diretoria não se mostre comprometida o suficiente com o combate à inflação pode levar os agentes econômicos a elevarem suas projeções de inflação futura, mesmo sem uma sinalização clara de que, porventura, essa seria a opção de quem tomou posse.

Após a última reunião, diante de votação dividida, um processo dessa natureza foi desencadeado, com repercussões negativas sobre a condução de política monetária.

Previamente à última reunião do Copom, já se notava um movimento incipiente de dúvidas com relação ao compromisso futuro de levar a inflação a 3%, que se traduzia em movimentos marginais de elevação das expectativas. Esse movimento era alimentado pela percepção de que a dinâmica fiscal futura estava se tornando mais insustentável, com a estratégia de recomposição das receitas batendo no limite do que a classe empresarial entendia como aceitável e a agenda de redução de despesas sendo muito custosa politicamente, principalmente para um governo eleito com uma bandeira não condizente com esses ajustes.

Ao apresentar a votação dividida e com os novos indicados todos votando por um corte de juros maior, a mensagem que se passou aos analistas foi a de que a futura composição do Copom, quando confrontada com escolhas difíceis, iria optar por ser menos dura com a inflação.

Compreendo a justificativa da necessidade de cumprimento do “guidance” que até então vigorava, mas a opção feita pelo Copom despertou receios futuros, levando a uma elevação das expectativas de inflação, as quais, inclusive, já se encontravam acima do centro da meta. Isso tornará as decisões futuras de política monetária mais custosas.

O modelo de metas de inflação tem seu eixo central no controle das expectativas. O argumento é que, uma vez que se tenha a confiança dos agentes econômicos no atingimento da meta estabelecida pela sociedade, quaisquer desvios nos números correntes tenderão a ser rapidamente corrigidos, dado que a população tem confiança de que a autoridade monetária fará o que for preciso para entregar o que foi acordado como meta de inflação.

Desde a última reunião do Copom, observamos um aumento substancial das expectativas de inflação, colhidas pela pesquisa do Focus, assim como as inflações “implícitas” contidas nos títulos negociados a mercado. Portanto, um dos principais pilares da condução da política monetária se encontra perdido. A grande questão a balizar a reunião de hoje do Banco Central é saber: como iniciar um processo de retomada dessa credibilidade que vem sendo perdida desde a última reunião?

Agora não resta outra opção ao Copom a não ser manter os juros em 10,5%, de maneira unânime e com um recado forte de que não irá aceitar desconfianças com relação à inflação futura. Além disso, necessitaremos que o decreto sobre a meta de inflação seja formalizado, sem deixar incertezas sobre a forma como se vai lidar com a inflação futuramente.

Além disso, para haver uma verdadeira melhora de humor com relação aos ativos domésticos, precisamos que a agenda de redução de despesas públicas seja retomada e referendada pelo Poder Executivo. Isso reforçaria a confiança dos agentes e permitiria que se vislumbrasse um movimento de melhora nas expectativas de inflação. Esse movimento de melhora nas expectativas geraria, em um ambiente global de queda de juros, condições para que a taxa Selic voltasse a ser reduzida futuramente. As condições para a economia brasileira voltar a ter juros mais baixos estão postas, basta fazer as escolhas corretas.