Ainda teremos que esperar para voltar a conviver em um mundo com juros mais baixos
Hoje teremos as tradicionais reuniões dos conselhos de política monetária dos bancos centrais do Brasil e dos EUA. Desde a primeira reunião de 2024, alguns pontos importantes foram adicionados à dinâmica macroeconômica e tornaram as decisões de política monetária ainda mais difíceis.
Por mais que a decisão de iniciar o ciclo de queda dos “fed fund” se dê na reunião de junho, a boa gestão da política monetária demanda que os sinais mais eloquentes deste processo comecem a ser dados na reunião de hoje. Podemos dizer que o início do processo de corte de juros nos EUA guarda um pouco de semelhança com o ocorrido no Copom.
A principal justificativa para efetivar o corte reside no patamar de juro real com o qual a economia está trabalhando, a despeito de estarmos vivenciando no momento uma atividade econômica ainda muito firme. O argumento fundamental é o de que, com um patamar de juros mais restritivo do que o desejado no momento, os riscos de uma desaceleração econômica mais profunda à frente aumentam, e o processo de cortes ocorreria justamente para minimizar os mesmos.
Por outro lado, um argumento contrário é o de que o impacto da alta de juros sobre a atividade econômica tem sido muito limitado, o que reduz a necessidade de corte. O recuo da taxa de inflação ao longo de 2023 ganhou a alcunha de “desinflação imaculada”, um processo em que os custos de se trazer a inflação de volta para um patamar mais baixo foram reduzidos, permitindo que a perda em termos de bem-estar social fosse bem mais baixa. Os fatores de produção ainda se encontram em patamar muito pressionado, levando a um risco em que uma reaceleração da atividade gere um novo repique da inflação rapidamente e exija com que os movimentos de cortes de juros sejam revertidos.
O ocorrido com o Brasil pode ser um bom ensaio para o caso americano. Já se discutiu bastante que a economia local, no recente ciclo monetário, apresentou características antecipadas ao resto do mundo. O Copom iniciou seu processo de corte de juros em um momento em que o crescimento da economia brasileira estava sendo revisto para próximo a 3,0%, bem acima do vivenciado na década anterior e bem melhor do que o esperado pelos agentes econômicos. A taxa de desemprego seguia (e segue) em sua trajetória muito próxima ao mínimo histórico, e a inflação iniciava uma rota descendente via preços mais voláteis, o que acabou por contaminar os outros preços da economia e trazer em conjunto a inflação para próximo ao centro da meta.
O que vemos agora? Tivemos um repique nos preços na virada de 2023 para 2024, com forte contaminação dos núcleos. Ou seja, mesmo com forte recuo na inflação, o processo de retorno à meta não se completou e começa a mostrar alguma volatilidade ao final do processo. Isso faz com que, como muito bem sinalizado pelo Copom, a opção seja por deixar a taxa de juros ainda em patamar contracionista a fim de completar o processo de retorno da inflação à meta.