Dinâmica das taxas nos EUA continuará a ditar humor dos ativos de risco, em ambiente de polarização rumo a eleição americana

Chegamos ao fim do ano, e é hora de revisitar as teses de investimentos de 2023 e identificar as oportunidades e os riscos para 2024.

Este ano começou com preocupações sobre a inflação americana, principalmente na parte de serviços, que pressionava os núcleos. Juntou-se a isso o mercado de trabalho aquecido, o que fez com que o mercado colocasse nos preços uma probabilidade de o Fed voltar a acelerar o ritmo de alta com 50 pontos-base na reunião de março. No Brasil, a discussão da substituição do teto de gastos trouxe grande incerteza com relação à sustentabilidade da trajetória da dívida, o que causou um grande estresse nos ativos domésticos.

O cenário começou a mudar a partir da quebra de alguns bancos americanos no final de março, o que fez o mercado acreditar que a alta de juros foi longe demais e a recessão era inevitável. No Brasil, o novo arcabouço fiscal foi aprovado no Congresso com um limitador de gastos de 2,5% de crescimento real, o que junto com o fechamento de juros nos EUA ajudou a impulsionar os ativos locais. A rápida atuação do Fed, oferecendo liquidez para os bancos pequenos e médios, permitiu que a crise ficasse restrita e não contaminasse outros setores da economia.

Nos trimestres seguintes, a economia americana, sustentada por uma política fiscal expansionista, reacelerou e aumentou a incerteza do desequilíbrio no mercado de trabalho. O risco geopolítico se acentuou com a guerra entre o Hamas e Israel, e o Tesouro americano aumentou as emissões, alertando as agências de rating, que vieram com mais um “downgrade” da dívida americana.

Essa combinação de eventos fez com que a parte longa da curva de juros americana saísse de 3,8% para 5%, impactando negativamente os ativos globais.

No Brasil, a agenda da busca do equilíbrio fiscal sofreu um duro golpe com a campanha para desistir da meta de déficit zero em 2024, aumentando a incerteza no meio do ambiente global incerto, ameaçando o ciclo de queda de juros do banco central brasileiro.

As coisas voltaram a se alterar quando o mercado de trabalho enfim começou a desacelerar nos EUA e na Europa, o que junto com números mais fracos da inflação reverteu a alta de juros da parte longa e passou a colocar uma alta probabilidade de corte de juros no primeiro trimestre de 2024. Esse zigue-zague do juro global foi responsável pela grande volatilidade e falta de tendência dos ativos em 2023, tornando a decisão de investimento muito difícil.

Estamos fechando o ano com um tom mais positivo. A perspectiva de queda de juros em 2024 nas principais economias, devido à forte convergência da inflação em direção às metas, está abrindo uma oportunidade para aumentar o risco e acreditar em um próximo ano mais positivo para os países emergentes, em especial o Brasil – que está se beneficiando do forte aumento da balança comercial proporcionada pelo setor agrícola e o aumento da produção de petróleo. A inflação brasileira segue surpreendendo positivamente, e o cenário da volta dos juros a um dígito de forma sustentável voltou a ser possível.

A dinâmica do juro americano continuará a ditar o humor dos ativos de risco em 2024. A perspectiva para a atividade nos Estados Unidos também será acompanhada atentamente para monitorar os riscos de recessão.

O principal risco para 2024 é a eleição americana. A polarização nos EUA não abre margem para fugir de um debate entre o atual presidente Joe Biden e o antigo presidente Donald Trump. Em um ambiente de crescente déficit na economia americana, a perspectiva fiscal ganha cada vez mais importância. O candidato democrata gosta de expandir os gastos e vai ser difícil enxergar uma responsabilidade fiscal em um ano de eleição. Já o candidato republicano gosta de reduzir impostos e vai buscar aumento de arrecadação nos acordos comerciais.

A China sofreu muito durante o governo Trump com as guerras comerciais. O novo ambiente geopolítico global vai acentuar esse atrito. A consolidação dos eixos entre EUA e China se consolidou, principalmente após a guerra da Rússia com a Ucrânia. O termo “nearshoring” se popularizou e teve seu movimento potencializado desde a pandemia, com o conceito de se produzir perto de casa cada vez mais tendo valor.

O ex-presidente Trump, que já incentivava essa ideia antes dessa piora geopolítica, agora vai usar como principal tema da campanha. O “made in USA” vai ser usado exaustivamente. O México, que sofreu embargos durante seu governo, dessa vez deve ser poupado e beneficiado. A China, que não consegue estabilizar e reerguer sua economia, vai ser o principal alvo e continuar amargando retornos negativos nos investimentos.

O Brasil, que desponta entre um dos grandes beneficiados futuros do nearshoring por ter os recursos naturais, não depender de matriz energética externa e ser grande exportador da pauta agrícola, resolveu estreitar os laços comerciais com China, Rússia, Irã e Arábia Saudita. O governo Trump será o grande risco para a economia brasileira em 2024, pois, para proteger a pauta de exportação dos EUA, o Brasil, como o principal concorrente na parte agrícola, corre o risco de sofrer sanções.