Desde a última reunião do Copom, tivemos desenvolvimentos que confirmaram a viabilidade de se iniciar o processo de redução da Selic

Após um ano estável em 13,75%, chegou o tão esperado dia em que o Copom dará início ao ciclo de corte da taxa básica de juros. Desde a última reunião, tivemos desenvolvimentos que confirmaram a viabilidade de se iniciar o processo de redução da Selic.

Em primeiro lugar, houve correção de rota com relação à decisão sobre a meta de inflação para os anos vindouros, com a acertada decisão de se confirmar uma meta de longo prazo em 3%, sem alterar o intervalo de tolerância. Isso foi suficiente para gerar uma melhora nas perspectivas inflacionárias futuras, com convergência da mediana das expectativas para 3,5%, embora ainda acima da meta de 3%.

A dúvida que nos resta é se haverá convergência para o ponto central da meta ou um prêmio de inflação permanecerá embutido até o momento em que o fiscal se consolide em uma trajetória de sustentabilidade (vale lembrar que ainda apresentamos déficit primário) ou que haja certeza de que não adotaremos uma postura monetária mais leniente em um próximo comando do BCB. Logo, a convergência para 3%, se ocorrer, é um assunto para os próximos anos e não para os próximos meses.

Em termos de inflação, o IPCA se encontra em seu melhor momento, com deflação de alimentação e de combustíveis puxando o indicador para patamar negativo. Sabemos que esses pontos são momentâneos e muito dependentes dos preços globais de commodities, tendo pouca influência das decisões de política monetária domésticas.

Desde a última reunião, tivemos oscilações significativas nos preços globais, com forte alta do petróleo. Inclusive, a defasagem da gasolina se encontra com preços domésticos cerca de 20% abaixo dos preços externos (na métrica de paridade de importação) e há uma narrativa equivocada que a decisão de alterar os preços internos dos combustíveis só pode ocorrer após a decisão do Copom, como se o momento da decisão sobre reajuste fosse a informação relevante e não o simples fato de haver a necessidade do reajuste.

No caso das commodities agrícolas, os preços globais apresentam elevada volatilidade, tendo subido mais de 10% ao longo do mês de julho e posteriormente devolvido toda a alta em poucos dias. Outro ponto relevante é que, apesar de sermos determinantes de preços nas commodities agrícolas globais, há uma descorrelação entre o preço doméstico e o externo, gerado pela supersafra local e a incapacidade de armazenamento, o que gerou um excesso de oferta desses produtos, levando a preços bem mais baixos. Para frente, o fator mais importante está ligado ao ciclo econômico global.

Ainda há dúvidas sobre o grau de recuo na atividade econômica. O mundo apresenta dualidade, com as manufaturas claramente em patamar recessivo, mas serviços ainda com crescimento puxado pelo mercado de trabalho firme e garantindo que o planeta não entre em recessão. A direção parece estar bem definida, com poucos fatores a gerar crescimento para os meses à frente e uma tendência de desaceleração mais clara, mas com a inflação ainda acima das metas das autoridades monetárias, impossibilitando que o processo de redução do aperto monetário se inicie.

No Brasil, em termos de atividade econômica, observamos um quadro semelhante ao internacional, com a produção da indústria em desaceleração, mas mercado de trabalho ainda firme mantendo os serviços em crescimento.

Ao final, o Copom decidirá entre iniciar com corte de 0,25%, indicando aceleração para um ritmo de 0,50% nas próximas reuniões, ou iniciar com corte de 0,50%, indicando que os próximos passos vão ser na mesma velocidade, com baixa probabilidade de acelerar os cortes para um ritmo mais elevado?

Cabe considerar alguns fatores: (i) Em seus modelos de projeção de inflação, observaremos um leve recuo para os próximos anos, com 2024 ainda acima da meta (levando em consideração Selic fechando o ano em 12,0%) e abaixo da meta em 2025 (levando em conta Selic em 9,25%). No horizonte temporal do BCB, o ano de 2024 ainda possui maior hierarquia frente a 2025. Esse fator advoga por um corte inicial de 25 pontos-base; (ii) O balanço de riscos, tanto interno quanto global, apresentou melhora, com a perspectiva inflacionária internacional melhor, mas ainda acima dos objetivos. Internamente, vimos recuo tanto na inflação cheia quanto nos núcleos, dando conforto ao BCB em iniciar o processo de corte de juros em ritmo de 50 pontos-base; (iii) Não achamos nenhum indício, observando episódios anteriores de corte de juros, de que a diferença entre o juro real ex-ante atual e o juro neutro (estimado pela autoridade monetária) seja um preditivo do grau de ajuste na política monetária, ficando muito mais como opção da autoridade monetária no momento da decisão de começar de forma mais “hawkish” ou mais “dovish”.

Logo, a decisão entre corte de 25 ou 50 pontos-base ficará em função da discricionariedade do BC, não havendo tecnicamente uma clara predileção de como iniciar o processo. A minha opção seria por um corte inicial da Selic para 13,25%, como resposta às diversas melhoras que tivemos no processo inflacionário ao longo deste ano. A decisão está nas mãos do Copom.