Enfim as condições estão sendo criadas para que o ciclo de corte de juros no Brasil se inicie na reunião de agosto

Após um início de governo com muito ruído na agenda econômica e um forte embate entre o Executivo e o Banco Central, enfim as condições estão sendo criadas para que o ciclo de queda de juros no Brasil se inicie na reunião de agosto. Perdeu-se muito tempo com a discussão de alteração da meta de inflação – defendida até por renomados gestores no Brasil -, o que, junto dos ataques ao presidente do BC, Roberto Campos Neto, ajudou na desancoragem das expectativas de inflação de longo prazo, que saíram de 3% para 4%, prejudicando a gestão da política monetária.

Do lado positivo, o novo arcabouço fiscal impôs um limite para o crescimento dos gastos em 2,50%, o que retirou um risco de cauda negativo de descontrole da dívida em relação ao PIB nos próximos anos. O desafio segue sendo estabilizar a dívida no longo prazo, pois o novo modelo precisa de um forte aumento de receitas nos próximos anos.

Na reunião do Copom de maio, foram elencados os seguintes riscos para o cenário de inflação à frente: na parte altista para a inflação e as expectativas, destacam-se (i) uma maior persistência das pressões inflacionárias globais; (ii) a incerteza ainda presente sobre o desenho final do arcabouço fiscal a ser aprovado pelo Congresso Nacional e, de forma mais relevante para a condução da política monetária, seus impactos sobre as expectativas para as trajetórias da dívida pública e da inflação e sobre os ativos de risco; e (iii) uma desancoragem maior ou mais duradoura das expectativas de inflação para prazos mais longos.

Com relação a esses riscos, a persistência da inflação de serviços global deve continuar. Já a incerteza com o arcabouço fiscal está praticamente resolvida, faltando apenas a votação no Senado.

O impacto positivo no fechamento das curvas longas e na queda do dólar ajudaram a contaminar positivamente a queda da inflação implícita e as expectativas de mais longo prazo. Essas vão continuar recuando quando o CMN confirmar na semana que vem a manutenção da meta de inflação em 3%.

Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma queda adicional dos preços das commodities internacionais em moeda local; (ii) uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada, em particular em função de condições adversas no sistema financeiro global; e (iii) uma desaceleração na concessão doméstica de crédito maior do que seria compatível com o atual estágio do ciclo de política monetária.

Esses riscos permanecem e vão se acentuar nos próximos meses, à medida que os efeitos do aperto da política monetária global impactem a atividade.

Desde a última reunião, a melhora dos indicadores foi significativa. O dólar caiu de R$ 5 para R$ 4,80, a projeção de inflação pela pesquisa Focus reduziu de 6,05% para 5,12% em 2023, de 4,18% para 4,00% para 2024 e de 4,00% para 3,80% (e deve continuar caindo com a confirmação da manutenção da meta em 3% pelo CMN), as inflações implícitas extraídas dos títulos NTN-B para os prazos de um, dois e cinco anos caíram de 5,0%, 5,6% e 5,9% para 3,8%, 4,4% e 5,2%. respectivamente. As commodities agrícolas ficaram estáveis em reais e o petróleo caiu.

O mais impressionante é que, apesar de toda essa melhora dos indicadores, a projeção do juro real nos próximos doze meses subiu de 7,3% para 7,4%. O mercado segue projetando um ciclo tímido de cortes na Selic. As revisões do PIB seguiram positivas, puxadas pelo setor agro, e o mercado de trabalho segue surpreendendo positivamente.

O comunicado de hoje deve seguir o padrão que o BC de Ilan Goldfajn usou para sinalizar o primeiro corte do ciclo quando a Selic estava em 14,25%. O ambiente macroeconômico estava parecido com o atual. A votação do teto de gastos havia sido aprovada na Câmara dos Deputados, mas ainda faltava o Senado.

O Comitê deve listar as condições e avaliar a evolução desse conjunto para que a flexibilização do juro se inicie em agosto, em um ambiente em que o juro real da economia se encontra em patamar muito elevado. O Brasil pode entrar em um ciclo virtuoso, sendo um dos únicos países do mundo a domar o processo inflacionário e tendo a permissão de iniciar um ciclo mais sustentável de corte de juros, atraindo cada vez mais capital externo, aproveitando-se da escassez de alternativas de investimento em países emergentes.