Apesar de momentos de ciclo diferentes, podemos observar uma inquietação global por conta dos riscos recessivos presentes nos EUA, Europa e Brasil

Mais uma super semana de reuniões de banqueiros centrais, com encontros nos EUA, Europa e Brasil. Apesar de momentos de ciclo diferentes, podemos observar uma inquietação global por conta dos riscos recessivos presentes.

Começando pelo Fed, o mais importante BC global, vemos que este se encontra em uma encruzilhada. Por um lado, o momento econômico ainda não permite que a luta contra a inflação se coloque como vencida, exigindo firmeza por parte da autoridade monetária, que corre o risco de parecer leniente com a inflação aos olhos da sociedade. Por outro lado, há um verdadeiro pavor econômico e político em citar o real fator que fará com que a inflação recue: o aumento da taxa de desemprego, que provavelmente virá acompanhado de um ambiente recessivo.

Em termos políticos, vimos em suas últimas aparições no Congresso que o presidente Jerome Powell passou por um verdadeiro inquérito por parte dos congressistas, com dúvidas pertinentes de quem não entende os mecanismos econômicos: por que, após um longo período em que os salários cresciam em termos nominais muito baixos, temos que interromper a melhoria salarial, principalmente da população mais pobre?

Em um mundo ideal, salários cresceriam e a inflação ficaria em patamar ainda baixo, com claros ganhos de bem-estar para a população. A questão é: isso é irreal, dado que os ganhos salariais acima dos ganhos de produtividade se transformam em inflação, alimentando a espiral de preços-salários.

Cechett et all (2023), analisando outros períodos de desinflação expressiva no mundo, detectam que todos os episódios de recuo da inflação desde 1950 envolveram necessariamente um aumento de no mínimo 200 pontos-base em termos de taxa de desemprego – caracterizando episódios recessivos.

No caso europeu, o ciclo monetário ainda se encontra muito atrasado. O patamar da inflação é muito acima do objetivo da autoridade monetária, e a normalização seguirá em curso. A autoridade monetária europeia se preparava para levar a taxa a patamares muito superiores ao atual quando eclodiram os episódios bancários nos EUA e na Suíça, trazendo receio por parte dos europeus de que entremos em um momento econômico mais desfavorável, levando também a uma recessão, principalmente importada, como reflexo dos acontecimentos do outro lado do Atlântico.

As recentes pesquisas bancárias na Europa levantam preocupação por conta de uma perspectiva de forte desaceleração nas concessões de crédito. Por outro lado, a resposta das autoridades fiscais do velho continente segue sendo de injetar recursos na economia, mesmo com a crise energética sendo parcialmente resolvida. Com isso, a dificuldade de trabalhar com uma taxa de juros baixa fica latente.

No Brasil, mais adiantado no ciclo econômico, as atenções se voltam para o movimento de reversão. Com uma taxa de juros real em patamar acima do considerado neutro, o BCB aguarda algumas informações vitais para poder iniciar o processo de distensão monetária.

Em primeiro lugar, o andamento do arcabouço fiscal é vital, principalmente nas medidas arrecadatórias, para trazer confiança de que conseguiremos alcançar o patamar de resultado primário condizente com estabilização da relação dívida/PIB. Outro ponto de extrema importância é a decisão sobre a meta de inflação, que deve ser tomada em junho.

Como toda a discussão pública foi em direção de um aumento no objetivo a ser alcançado pela autoridade monetária, as expectativas de inflação apresentaram divergência, ajustando para um cenário de maior incerteza de qual objetivo que a sociedade brasileira, na figura dos representantes eleitos pela população, buscará. Ou seja, parte das expectativas já foi perdida.

Aí entra o ponto relevante da decisão: caso a escolha seja por buscar uma meta mais baixa, no mesmo patamar da atual, deveremos ter uma melhoria nas expectativas, dado que o processo decisório da sociedade terá se configurado numa surpresa positiva, com os representantes eleitos tendo entendido os custos e riscos envolvidos em torno de uma meta de inflação mais elevada e não querendo incorrer neles. Com isso, o prêmio da inflação envolvido nos contratos irá recuar, gerando melhora nas expectativas, melhora nas projeções de inflação do BCB e com isso, abrindo espaço para cortes na taxa Selic.

Caso a decisão seja por alterar o patamar da inflação a ser alcançada, nova rodada de deterioração das expectativas ocorrerá, aumentando prêmio de inflação e dificultando o trabalho do BCB.

Logo, vemos que o Legislativo e o Executivo têm suma importância na decisão acerca do momento em que o processo de corte dos juros será iniciado.

Vemos uma característica comum às três decisões da semana, tanto no caso de quando encerrar o ciclo ou de quando iniciar a sua reversão. Nestes momentos, o cenário fica mais nebuloso, com indicações mais incertas direcionando para todos os lados e dificultando a uniformidade no direcionamento da decisão. Por isso, na tomada de decisão nos momentos incertos, deve-se operar a arte da política monetária.